01 julho 2008

« como a queda dum sorriso p'lo canto triste da boca, neste vazio impreciso só a loucura me toca. »

há uma força vertiginosa e incolor que me empurra para os poetas. se eu a tento ignorar, ela faz-me tropeçar em poemas até os olhar de frente.
pergunto-me se todos os que se deixam cair nas letras, acabam por tombar também sobre a solidão, como se fosse ela poética e feliz. a única resposta que encontro vem de longe, com o vento que traz o cheiro de outras margens. segreda-me ele ao ouvido: vem, menina, está na hora... e eu sinto um arrepio na pele, e obrigo-me a ficar mais um tempo, porque sei que a virtude reside também em saber esperar pela hora certa, quando o desejo já quase tomou conta de tudo.
é esta espera a companhia que agora me resta, e que sinto como se me rasgasse por dentro.
e no fundo dos meus sonhos estão letras, milhares de novelos de letras, e os teus olhos. (são os mesmos de outros tempos; fitam o mundo todo, só não olham nesta direcção.)
nunca a solidão foi tão vazia.
o meu cabelo encaracola mais a cada dia que passa, e as sardas que trago no nariz multiplicam-se e saltam-me para perto dos olhos - consequências habituais dos dias de sol. por dentro, sinto-me a envelhecer. um pesado cansaço, em discrepância com a aparência jovial.
tenho medo dos rostos familiares, como se pudessem plantar em mim saudades de outras viagens. mas, se reparar bem, a maior parte já mal reconheço, de tão desfigurados que estão.

passa-me a minha mochila, eu tenho de ir. passa-ma, este sítio já não tem mais nada para mim. não chores, por favor. eu vou à procura de algo que me encha o peito, para poder encher as folhas em branco que levo. tenta compreender...

mas é desnecessário pedir compreensão a quem pressente a profunda dor da ausência.
no meio de tudo isto, acordo e a confusão das minhas palavras é a mesma dos meus pensamentos. os teus olhos estão colados ao muro do meu passado.
há vozes de poetas a ecoarem no salão vazio do meu desamor por ti, e há uma força vertiginosa e baça que me empurra para o alcance da tua vista. queria eu saber-me incapaz de ceder a um caminho que contenha os teus passos...
pelos vossos poemas, por favor, não deixem que ele me olhe de frente.

os teus olhos continuam incrivelmente belos e eu,
sem saber, continuo permanentemente a cegar.

4 comentários:

éme. disse...

Há olhos que nos prendem, sim, Rita...
Mas se nos prendem é porque não nos iriam nunca deixar abrir asas e ser maior, ser melhor...
Parece uma impossibilidade, isto visto assim, mas é a verdade crua: há olhos que nos prendem mas não são esses os que nos fariam bem!
Cru!
:)
Rita...
Escreves com tamanha alma que é bom que venhas aqui para esta terra: anda precisada de escritas vivas como a tua, de almas abertas ao vento, como a tua! (ainda que te penses cansada, moída, meio destruída... Viva!!)

Há olhos, efectivamente, incrivelmente belos: esses são os que nos dão a mão e empurram docemente dizendo: queres voar? Então salta bem alto. Voa! :)

*****

Sr. Jeremias disse...

Os olhos, sempre os olhos... E as mãos.

Não vale a pena tantas ignorar a força sabes? Ela sabe bem o que faz...

Telma Teixeira disse...

Gostei=)

Daniela disse...

eu acompanho-te (no coração) para esses novos sítios onde vais (de certeza) encher as folhas que levas(ainda) em branco.