24 julho 2005

Tenho-me a mim. E a mim.

Pegaram em mim e adormeceram-me, à força.
Lembro-me de ver coisas brilhantes e fininhas e pontiagudas, antes dos olhos se fecharem.
Quando uma delas veio em direcção a mim, acho que comecei a sentir os Tic – Tac’s do relógio a aumentarem de velocidade... Os Tac’s caíam apressados aos pés dos Tic’s, e os Tic’s não se faziam esperar. Uma melodia frenética, que me fazia sentir aquele maldito ponteiro dos segundos dentro do peito.
Depois vim a perceber que, possívelmente, era só o meu coração a bater mais depressa.
Sempre tive muitos medos. Agulhas, era só mais um.
Pegaram em mim e amachucaram-me. Como um bocado de papel, onde se desenham dedos tortos e estrelas e bolinhas e coisinhas, das noites sem sono. E onde se escrevem coisas sentidas... Que mais tarde fazem chorar, e dão vontade de destruir cada uma daquelas letras.
Um bocado de papel que se amachuca. Para esquecer.
Eu fui uma folha de papel. Rasgada. E todos se quiseram esquecer de mim.
A minha mãe não me abraçou. O meu pai não me sorriu. O meu irmão não me beijou a testa.
Não me quiseram explicar nada. E eu não entendi...
Quando acordei, só pude ver aquela marca feia, no peito. Que nem doía. Que nem me fazia chorar...
Roubaram-me o coração e deram-no a uma menina de olhos bonitos. Disseram que ela precisava mais dele do que eu. O dela era fraquinho e o meu não...
Disseram que eu não o tratava bem, e que ele iria ficar melhor com ela...
Não sei se alguém foi recompensado por isto. Mas, se calhar, foram ao sítio onde acaba o arco-íris buscar o pote de moedinhas de ouro, e distribuíram-no pela minha família. E eles entregaram-me às coisinhas brilhantes e fininhas e pontiagudas.
Já não sinto.
Roubaram-me o coração sem me pedir licença. E, agora, há por aí uma menina de olhos bonitos a viver o que é meu. A sentir o que eu tinha lá guardado. A sentir(-me).
Às vezes, sangra. E as paredes deixam de ser brancas.
Às vezes, oiço uma música de fundo, numa voz doce e clara. E eu acompanho-a, baixinho...
Às vezes, precisava de deixar de me lembrar daquela voz que dizia ‘Fica quieta, não vais sentir nada’.
Precisava dum beijinho. E dum abraço. Com cuidado...
Porque há cicatrizes que já não desaparecem.


/me on Placebo - Protège Moi

19 julho 2005

Acredito. *


« Pode-se dormir no ombro de alguém uma vida inteira e morar noutros corpos, que nunca se tocaram. »

Deixa-me acreditar... Sim?
E, se puderes, acredita também. Como [dizes que] acreditas em mim...

Porque, no fundo...
Eu só queria que me devolvesses a vontade de consumir a vida de uma só vez...
Para saber se ela sabe mesmo a gomas... e a coisinhas doces.

08 julho 2005

« Tira a mão do queixo, não penses mais nisso... »


Eu quero ficar sentada nos passeios. E quero gritar assim muuuiito alto, na rua, coisinhas sem sentido!
E quero ficar a sentir os cabelos a mexerem-se muito com o vento, com vontade de se desprenderem e voarem sozinhos. Sem me quererem levar com eles...
Eu não quero ter de parar de sorrir, enquanto vejo uma menina pequenina e lourinha com olhinhos d' àgua.
Eu quero crianças! E flores. E músicas. E cores.
Eu quero a [minha] Nônô... aqui. Quero poder tirá-la lá de cima, e dar-lhe um abraço apertadinho e chorar e/a sorrir.
Eu quero deixar de adormecer a ver uma estrela. Que foge sempre, antes de eu ter tempo de a apanhar.
Eu não quero chorar.
Oh, eu quero tanto chorar...
Mas eu não quero magoar-me. Para chorar. Para sentir...
Eu quero um beijinho na mão. E uns olhinhos redondinhos a verem-me.
Eu quero espuma! E bolinhas de sabão! E caretas. E coisinhas...
Quero relva. E cheirinho a verde. E a fadas!
Oh, eu quero que uma fada amarela me venha dar a mão e me leve para trás do arco-íris.
E quero cantar. E dançar.
E não quero mais ter de ouvir vozinhas dentro da cabeça, que magoam...
Eu quero um colinho quentinho. E uma festinha na cabeça. E um céu colorido, com uma nuvem cor-de-rosa.

Pode ser?



/me on Jorge Palma - Terra dos Sonhos

04 julho 2005

' A recordação da felicidade já não é felicidade. A recordação da dor ainda é dor. '

Só queria ser capaz de substituir as mãos.
E os sítios. E as roupas. E os bancos. E os baloiços. E os olhos. E o tom de pele. E as mãos. E os dedos. E as lágrimas, de quando ainda era possível sentir... E as mesas. E as camas. E as casas. E a campainha. E os espelhos. E os filmes. E os pés, descalços. E as meias. E os cabelos, compridos. E as mãos, que eram perfeitas. E a boca. E os sorrisos. E os risos. E o perfume. E os [a]braços. E a vergonha. E a teimosia. E a [gloriosa] persistência. E o medo. E a culpa. E as palavrinhas, mágicas... E a areia. E as ondas. E o vento. E as bolachas. E os dentes. E a língua. E a relva. E as árvores. E os autocarros. E a vontade. E a felicidade.
Ou apenas as mãos.

Bolas.
Onde ficou o ponto quente?



/me on Ornatos Violeta - Mata-me outra vez