12 março 2008

« Não me abandones nesta margem, eu sou parte da viagem. »

Os meus olhos estavam tão embaciados que a paisagem passava a fugir pela janela e eu nem a conseguia fixar. Não tive a noção do tempo a passar, porque entre o momento em que me sentei naquele lugar e o momento em que me levantei, não estive completamente consciente. Fui, a viagem toda, virada para a janela com os raios quentes a baterem-me na cara. As lágrimas não paravam de nascer; foram, o tempo todo, a balançarem-me nos olhos.
Quando estás só e a dor é tão funda que nem consegues pôr travão ao choro, só te resta a música. Foi assim que abri a minha mochila das viagens, que ia acomodada no banco ao meu lado (por mais voltas ao mundo que dê, aquele The Cure que traz estampada nunca desaparece), e tirei de lá o meu aconchego. Meti os phones nos ouvidos e foi quando comecei a sentir as primeiras festas na cabeça e o primeiro beijo na testa. Continuei a sentir a falta dum abraço amigo, algo tocável, mas, apesar disso, senti-me um bocadinho mais reconfortada.
Não soube amaldiçoar a minha falta de ponderação, a minha falta de visão para com o mais óbvio, a minha vontade avassaladora que me faz apanhar comboios para longe... Só soube sentir uma tristeza violenta nas mãos, nos joelhos, no peito, na cabeça, nos lábios, nos olhos.
Durante as horas que durou aquela viagem de regresso, a minha vida estagnou e pôs-se a boiar num plano acima de mim mesma. Eu não reagia a nada, nem aos sons ou imagens à minha volta. Caguei, literalmente, em tudo o que pode ter acontecido em meu redor. Acho que nunca antes tinha vivido uma sensação semelhante.
O meu olhar foi fixo num ponto qualquer do vidro que, apesar do Sol, eu vi sempre molhado.
Sabes como é... Sempre que te atiras de cabeça, arriscas-te a magoares-te. Eu sou das que acredita que, regra geral, vale a pena o risco. E quando mexe com o que te preenche o céu, nem tens tempo de pensar nos riscos; quando dás conta, já te atiraste. De qualquer das formas, é tudo demasiado fugaz para deixares de fazer o que o coração te pede e os seguros vitalícios aborrecem-me. Por isso, não pensei muito quando surgiu a primeira oportunidade de te voltar a abraçar.
Estatelei-me no chão, parti-me toda, e tu ainda foste lá pisar-me um bocadinho com a ponta do sapato. Que rico abraço, han.
Quando cheguei à minha estação, muito devagarinho, a vida veio voltando a mim. Limpei os olhos, respirei fundo, meti a mochila às costas e, quando meti os pés no chão, indiferente a tudo, comecei a fazer o caminho para casa. Naquele momento, tive o peso todo dum sonho de adolescente inocente acabado sobre mim.
Já não haveriam mais lágrimas nem mais bilhetes de comboio para esse destino, soube-o ali.











(...)
– Give me one good reason.
– 'Cause I'm different.
– Really? Okay, what color are my eyes?
– Well, at first glance, your eyes are brown. But when the light hits them, they change to amber. And if you look really closely around the iris, the color is pure honey... But when you look into the Sun, they almost look green. That's my favorite.
How did I do?
– I would've settled for brown.


Maldito sejas, que vias sempre verde nos meus olhos.

7 comentários:

Anónimo disse...

Olá Rita. Descobri-te recentemente e, desde o primeiro post que li, fiquei rendida. Sabes, acho que devemos arriscar... senão sempre, na maioria das vezes, e acima de tudo, sempre que for para seguir aquilo que o coração nos diz. Podemos estatelar-nos no chão, ficar com os ossos da alma completamente doridos, ver o sol encoberto pelas lágrimas que nascem.. pelo menos, ficamos a saber e quando nos levantamos de tudo isto, sarando as nossas feridas, tornamo-nos muito mais fortes. E metendo-me um pouco no assunto, se ele apenas conseguiu ver o verde dos teus olhos, mas não conseguiu ver o que está pralém disso... dá que pensar. Beijinho gande***

Su(sana) disse...

«(...)
Não vou ganhar
Nem perder
Nem me lamentar
Estou pronta a saltar
De cabeça contra o mar

Não vou medir
Nem julgar
Eu quero arriscar
Tenho encontro marcado
Sem tempo nem lugar
(...)»

[*]

Anónimo disse...

tu fazes parte da minha viagem.

abraço, Rita.




[Annie]

Anónimo disse...

eu sempre acreditei q vale a pena o risco.agora já não sei, já não sei nada...

Cabelos Dourados disse...

Eu conheço o diálogo. =) .

Lord of Erewhon disse...

Sem dúvida, o amor é a maior ilusão feminina e o corpo como varinha de condão da paixão... a sua maior privação de inteligência.

Dark kiss.

Bruno disse...

Apareci aqui por curiosidade. Li o que escreveste e gostei bastante, gostei sim.

O coração é uma chama perpétua que entra numa combustão exponencial. É preciso apagar este fogo, só um mergulho repentino e sem hesitações apaga esta chama... quando apaga.

Agora? eu tapo o nariz e afundo-me solenemente, o choque não é tão grande, mas a chama demora mais a apagar.

*