13 outubro 2007

Segredo.


As minhas mãos apalpam mais uma vez o chão e eu sinto as pontas dos meus dedos sorrirem. Baixo-me e sento-me no fofo manto verde. Quem me dera poder viver esta sensação todas as manhãs da minha vida...
Descalço-me. Os meus pés sentem o fresquinho da relva e eu deixo-me cair. Nunca nada me soube tão bem como deixar-me mergulhar no verde. É uma sensação infantil e quase primitiva – existiu sempre e nunca desaparece. Sabes aquilo que eu te falava de nos sentirmos em casa sem precisarmos estar debaixo dum tecto sólido? Sinto o verde do jardim como a minha casa. (Quem me dera poder mostrar-te o quanto é clara e solarenga...)
Hoje, tenho a sombrinha da árvore grande para mim, que bom... Deitada, vejo-lhe os ramos que tocam no azul gigante e nas nuvens. Vejo-lhe as folhas, as flores... e uma vem a voar de mansinho e pousa-me na ponta do nariz. Vejo os raios de Sol que passam por entre os ramos e me dão o bom dia; quase lhes consigo tocar.
Se eu fechar os olhos, também quase te vejo. Estás a fazer-me cócegas aqui mesmo, neste sítio. Eu rio-me e tento fugir. Acabamos por cair aqui, debaixo da árvore grande e eu deito-me de costas na relva. Tu imitas-me, olhas para o manto de azul por cima de nós, e dizes:
– Esta noite, podíamos aqui vir. É um bom sítio para eu te mostrar as constelações.
Quando volto a abrir os olhos, tenho um sorriso tolo nos lábios, mas ao meu lado só estão as minhas chanatas. Respiro fundo e tiro da mala o caderno.
Escrevo um segredo, dos que não se podem dizer em voz alta, numa folha e arranco-a. Estico-me o mais que consigo e meto-a, já muito dobradinha, no ramo mais alto a que consigo chegar – que, mesmo assim, é quase o mais baixinho da árvore-mãe. Faço-lhe uma festinha no tronco e digo baixinho:
– Shhh... Guarda-o bem. Eu sei que só tu, que és da relva também, podes sentir.
Meto a mala ao ombro e vou-me afastando descalça, com as sandálias na mão, a caminhar pela minha alcatifa fresquinha.

E só cinco passos depois do começo da calçada, é que deixo de olhar para trás e de nos ver deitados debaixo da árvore, e sinto as pedras debaixo dos pés.











(Se eu pudesse, amava-te.)