10 novembro 2006

Foi amor.


A primeira vez que te vi, imaginei-me a abraçar-te. Ri-me durante muito tempo com esse pensamento e pensei o quão seria bom (e difícil) ter um abraço teu. Sonhei tantas vezes contigo... Não tantas como com os outros, de olhos fechados e adormecidos. Mas de olhos abertos. E nunca soube controlar isso.
Vivemos muito, é verdade.
Há muito tempo, ficámos uma tarde inteira sentados num banco de jardim, com um livro de Biologia ao nosso lado. Lembras-te? Passou tão depressa... No fim, já era noite. Noite gelada. Éramos os únicos no parque, porque estava demasiado frio para se ficar na rua àquelas horas. E nós continuávamos sentados no mesmo banco de jardim, apesar das mãos geladas. Punhas o teu braço à minha volta, até a tua mão chegar ao meu ombro, e comíamos pipocas. Como se fossem três da tarde.
Eu tinha as unhas tão vermelhas... O coração também, mas custava-me admiti-lo.
Não entendeste que a parte mais triste foi aquela em que me levaste até ao autocarro que me ia levar a casa. Estava tão escuro e tanto frio. Dissemos adeus e eu vi-te ires embora, de dentro do autocarro vazio. O livro de Biologia voltou comigo. E eu só sei que, apesar da falta de concentração e de estudo, tive 18 nesse teste.
A partir daí, fomos sempre mais felizes.
Embriagámo-nos umas quantas vezes. Nessas alturas, tu tomavas sempre conta de mim. Riamo-nos de mãos dadas, enquanto fazíamos os caminhos a pé até casa.
Vivemos um Verão inteiro juntos e não soubemos passar um sem o outro. Eu contava-te coisas da minha vida que nunca tinha contado a ninguém. Tu fazias sempre muitos planos para o futuro, ao mesmo tempo que me pedias um beijo.
Nos típicos dias de Avante, acampámos juntos e tivemos os vizinhos mais insuportáveis de sempre. Eu tinha sempre vontade de fazer chichi. E fome. Tu gostavas de ir procurar cd’s, na Festa do Disco, e eu ficava cansada. Só queria ver todos os meus Amigos. Mas cheguei a ver muito poucos. Ou quase nenhuns.
À noite, metias-me o teu gorro na cabeça e dizias que nunca me tinhas visto tão linda. Eu vestia as tuas camisolas e casacos, que quase me chegavam aos joelhos e tapavam as mãos. Na última noite, deitámo-nos na relva a ver o fogo de artifício. E falámos tanto... Mas, tu sabes, eu já não estava muito sóbria.
Deste-me um barrete comprido, sem sininhos na ponta... E eu, por momentos, esqueci os meus amores platónicos.
Amámo-nos o mais que soubemos. E fomos felizes como nunca antes tínhamos sido.
Nesses dias, olhei para ti como nunca tinha olhado antes. Tinha a certeza que não queria sair dali, porque nunca te tinha amado tanto. E porque sabia que as coisas iam acabar por mudar. Mudam sempre. Por isso, é que desejamos sempre morrer quando chegamos ao pico da felicidade. Como nós desejámos, nessas noites de Verão.
Depois disso, pintaste na minha mochila The Cure e um coração, com letras grandes e cor-de-rosa.
Meu amor, ainda faço a pé os mesmos percursos que fazíamos de mãos dadas e embriagados, naquelas noites quentes. Mas agora, sozinha. E com A Cura às costas.